INTRODUÇÃO
Este presente trabalho pretende problematizar a
questão relacionada ao processo de globalização e de modernização da sociedade
brasileira e seus impactos nas áreas rurais e urbanas. Antes da presente
discussão, relacionamos as três linhas teóricas estabelecidas entre campo e
cidade, além disso relacionamos tais fatos com os impactos causados pela
globalização e, intertextualizamos com a história do Brasil, trabalhando em uma
linha tênue repleta de consequências.
A dicotomia entre campo e cidade foi e continua até os dias atuais sendo representada em diferentes artefatos artísticos e em diversas composições musicais, entretanto o campo sempre estivera associado a paz, calmaria e a felicidade, já a cidade como pertencente a loucura, ao stress e a infelicidade.
Tais representações estão vivas até os dias de hoje no imaginário de grande parte da população, e, aquela bela canção gravada pela primeira vez em 1966, Saudade de Minha Terra, que fora interpretada por cantores como Chitãozinho e Xororó nos faz imaginar o mesmo sertão de décadas atrás.
De que me adianta viver na cidade
Se a felicidade não me acompanhar
Adeus, paulistinha do meu coração
Lá pro meu sertão, eu quero voltar
Ver a madrugada, quando a passarada
Fazendo alvorada, começa a cantar
Com satisfação, arreio o burrão
Cortando estradão, saio a galopar
E vou escutando o gado berrando
Sabiá cantando no jequitibá
Saudade de Minha Terra - Compositor: Goiá / Belmonte
Esta imagem de que o campo permanece imutável ao tempo e que “a selva de pedras” ainda é o lugar que contém o maior desenvolvimento econômico, político, social e juntamente a esses pilares também o tecnológico está no imaginário de grande parte da população brasileira que acredita que campo é o oposto de cidade.
[...] parece relacionar-se com o grau de subdesenvolvimento das regiões: em áreas onde a agricultura mantém uma importância social, econômica e simbólica elevada e onde os efeitos dos valores e dos estilos de vida urbanos são menos intensos, a identificação do mundo rural com realidades centradas na natureza e na agricultura é ainda muito significativa. Por estas razões, as áreas rurais são vistas como opondo-se às áreas urbanas. (FERRÃO, 2003, p. 252).
Entretanto, existe uma outra linha teórica que apresenta o ambiente rural e urbano estão cada vez mais similares pelo feito de ambos estarem sendo influenciados pelos efeitos da globalização. Um dos pesquisadores que trouxe essa nova abordagem foi Wanderley.
O fim do isolamento entre as cidades e o meio rural é frequentemente expresso através do conceito de continuum rural-urbano. Este conceito – tanto quanto o de urbanização do campo – é utilizado em duas vertentes principais. A primeira delas corresponde a uma visão “urbano centrada” (Rambaud, 1973), que privilegia o polo urbano do continuum como a fonte do progresso e dos valores dominantes, que se impõem ao conjunto e que tenderia a reduzir-se sob a influência avassaladora do polo urbano. (...) Levada às últimas conseqüências, esta vertente das teorias da urbanização do campo e do continuum rural-urbano, apontam para um processo de homogeneização espacial e social, que se traduziria por uma crescente perda de nitidez das fronteiras entre os dois espaços sociais e, sobretudo, o fim da própria realidade rural, espacial e socialmente distinta da realidade urbana. Wanderley (2001, p. 33)
Percebe-se então que para o pesquisador o ambiente rural e urbano não possui uma linha tênue que os separa com suas definições claramente delimitadas. Entretanto, existe ainda uma outra linha teórica que faz acredita que, apesar da grande influência da globalização no meio rural, ainda podem ser analisadas características muito peculiares deste lugar.
Os teóricos que trabalham sobre tal perspectiva e são muito difundidos em livros didáticos e materiais paradidáticos são Santos, Mota e Schmitz, Marques e Carneiro, este último afirma que:
[...] não podemos entender a ruralidade hoje somente a partir da penetração do mundo urbano-industrial no que era tradicionalmente definido como ‘rural’, mas também do consumo pela sociedade urbano-industrial, de bens simbólicos e materiais (a natureza como valor e os produtos ‘naturais’, por exemplo) e das práticas culturais que são reconhecidos como sendo próprios do chamado mundo rural (CARNEIRO, 1997, p. 158).
Santos, vai além e compreende que a especificidade do campo, trazendo uma reflexão muito elucidativa, crítica e reflexiva sobre a presente questão.
[...] se o espaço se torna uno para atender às necessidades de uma produção globalizada, as regiões aparecem como as distintas versões da mundialização. Esta não garante a homogeneidade, mas, ao contrário, instiga diferenças, reforça-as e até mesmo depende delas. Quanto mais os lugares se mundializam, mais se tornam singulares e específicos, isto é, únicos (SANTOS, 1988, p. 46 e 47).
Observa-se então que Santos acaba sendo totalmente contrário ao que a outra linha teórica acredita, uma vez que se opõe a ideia de que a globalização influenciou totalmente as características na vida do campo. Segundo o pesquisador, quanto mais estes lugares fizerem parte deste processo mais singulares serão.
Entretanto, deve-se ter atenção em relação aos modelos produtivos no campo. Isso porque, com o modelo capitalista, muitas questões tiveram que ser repensadas e até reformuladas para que alcançasse seu maior objetivo: a obtenção de mais lucro e consequentemente mais capital.
Para isso, um dos principais e mais influentes modelos adotados foi a monocultura, que segundo Gliessman é:
[...] uma excrescência natural de uma abordagem industrial da agricultura, em que os insumos de mão-de-obra são minimizados e os insumos baseados em tecnologia são maximizados com vistas a aumentar a eficiência produtiva. As técnicas de monocultivo casam-se bem com outras práticas da agricultura moderna: a monocultura tende a favorecer o cultivo intensivo do solo, a aplicação de fertilizantes inorgânicos, a irrigação, o controle químico de pragas e as variedades especializadas de plantas. A relação com os agrotóxicos é particularmente forte; vastos cultivos da mesma planta são mais suscetíveis a ataques devastadores de pragas específicas e requerem proteção química. (Gliessman (2000, p. 35)
Especificamente em relação ao Brasil, a utilização desta técnica de monocultura, trouxe diversas consequências, principalmente para população do norte e nordeste do Brasil em que a falta de alimentos assola muitas famílias, trazendo a morte de muitas famílias bem como a falta de perspectiva.
Para que possamos compreender tais desdobramentos, temos que compreender que:
Descobrindo cedo que as terras do Nordeste se prestavam maravilhosamente ao cultivo da cana-de-açúcar, os colonizadores sacrificaram todas as outras possibilidades ao plantio exclusivo da cana. Aos interesses de sua monocultura intempestiva, destruindo quase que inteiramente o revestimento vivo, vegetal e animal da região, subvertendo por completo o equilíbrio ecológico da paisagem e entravando todas as tentativas de cultivo de outras plantas alimentares no lugar, degradando ao máximo, deste modo, os recursos alimentares da região (CASTRO, 2006, p. 97).
Com tal afirmativa, conseguimos compreender que a preocupação em erradicar a fome, juntamente coma pobreza em momento algum foi repensada, fazendo com que a única preocupação de tais latifundiários fosse a otimização de lucros em tal modelo de produção, como citado desde cedo, os colonizadores se atentaram ao que a terra poderia render, e, até hoje, a única preocupação de quem faz parte deste sistema continua sendo a terra juntamente com o capital que a todo instante é priorizado e almejado.
Este incessante desejo de lucros, não é uma característica especifica do nosso sistema capitalista. Afinal como Santos observou ao longo do período colonial, os europeus queriam saciar sua “fome de metais preciosos”.
O período colonial caracterizou-se por intermináveis tentativas de se libertar economicamente da metrópole. O Território brasileiro ocupou a posição de fornecedora de matéria prima. A estrutura produtiva que se forma encontra-se condicionada às características do mercado europeu, ao qual atendia. A tecnologia empregada, a base financeira, as modalidades de comércio estavam profundamente condicionada às características da tecnologia, financiamento e comércio europeu. Poucas vezes se adotaram pautas locais, no campo da produção e circulação, e quando isto aconteceu deveu-se a particularidades geográficas ou climáticas insuperáveis. Assim, a produção assumiu um caráter extensivo para atender à fome de metais preciosos e de produtos tropicais que tinha a Europa. Amplas regiões foram devastadas, produziu-se um terrível desequilíbrio ecológico, regiões de produção ou caça e pesca dos indígenas foram-lhes tomadas violentamente e novas doenças lhes foram transmitidas (SANTOS, 1994, p.25)
Esta busca incessante por dinheiro, fez com que houvessem muitas consequências para o meio ambiente. Afinal desde a época da colonização a terra é vista como apenas um modo de enriquecimento, causando desde então inúmeros efeitos ecológicos.
Relacionando especificamente os efeitos da modernização no campo, podemos observar que:
Com a tal modernização, [...] estão nos forçando a dedicar à monocultura. [...] Junto [...], estão vindo [...] técnicas agrícolas que não se casam com a Natureza. As nossas terras estão [...] mais pobres. [...]. Não é justo que continuemos com uma agricultura desse jeito. Nós precisamos ter responsabilidade sobre o futuro e [...] os bens naturais que teremos que deixar pra nossos filhos. (ICKERT, 1980 apud GRAZIANO NETO, 1982).
Outro pesquisador que vem ao encontro de Graziano Neto, é Amstalden que compreendeu que os principais problemas se devem aos seguintes fatos:
1) a tecnologia utilizada é reducionista e desconsidera as intrincadas relações do meio ambiente, sendo por isso agressiva acarretando graves perdas, além de não controlar eficientemente problemas, mantendo a lavoura sob dependência do sistema industrial que lhe é exógeno;
2) no caso brasileiro a situação agrava-se na medida em que a tecnologia foi desenvolvida para realidades ecológicas e sociais do primeiro mundo e foi introduzida aqui sem considerar-se essa diversidade. O resultado é, portanto, maior dependência e menor eficiência;
3) o custo dessa agricultura é muito alto, beneficiando os grupos já capitalizados e excluindo os demais. O custo ainda é muito grande do ponto de vista energético, já que há grande utilização de recursos não-renováveis;
4) a agricultura industrial é monopolista. De um lado se monopoliza a produção por parte de grandes proprietários rurais beneficiados pela disponibilidade de capital; e do outro se monopoliza a tecnologia por parte de grandes grupos empresariais. Nota-se que o monopólio produtivo agrava os desequilíbrios sociais e o monopólio técnico mantém a dependência do país às importações elevadas e confere aos detentores da tecnologia um poder econômico e político sobre o Brasil;
5) há um grande domínio da pesquisa e o seu direcionamento para a manutenção do modelo agrícola vigente. Isso inviabiliza soluções e técnicas mais adaptadas e menos agressivas.
Desta forma observa-se que, a tecnologia trouxe inúmeros benefícios econômicos, para aquele que detêm a terra e o meio de produção, especificamente aqueles que utilizam a monocultura como modelo produtivo para seus imensos hectares de terra, mas a Natureza não está mais comportando esse aproveitamento sem medir as consequências.
CONCLUSÃO
CONCLUSÃO
A realização deste trabalho foi muito motivadora, uma vez que, a
cada artigo que liamos, mais referências detínhamos e, a cada nova informação
conseguíamos montar um painel mais completo acerca do tema.
Outro ponto que nos chamou a atenção, foi ao fato de termos
interpretações conflituosas fundamentalmente das linhas sociológicas que
diferenciam ou não campo e cidade.
Entretanto, algo que era consenso em todas as publicações que lemos
foi o fato dos impactos oriundos da tecnologia.
A cada artigo que liamos sobre tal temática nós observamos constatações
cada vez mais preocupante sobre o impacto do homem fazer o que almeja, apenas
com um intuito: obtenção de lucro.
Por fim, outro aspecto muito interessante foi o fato de retomarmos
fatos históricos em nossa pesquisa, já que é de vital importância para
conseguirmos compreender melhor cada fato e nos fazer pensar, até quando tal
lógica permanecera? Afinal vemos mais permanências do que rupturas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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população. 7. ed. São Paulo, Brasiliense, 1965, v. 1 e 2.
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